sábado, 6 de setembro de 2008

Ainda sobre o apanhador no campo de centeio ...

J.D. Salinger foi duplamente genial.
Primeiro, concebendo a estória de Holden Caufield, um adolescente comum, angustiado e perdido nas suas dúvidas. Um garoto procurando respostas que ele mesmo sabe que não vai encontrar. "Para onde vão os patos que vivem num certo lago do Central Park quando tudo fica congelado no inverno?". Esta é uma das perguntas que ele faz a si mesmo e aos outros. Uma pergunta boba, ingênua e sem sentido, mas que ganha proporções colossais se for entendida como : "Para onde podemos ir quando o inverno se instala em nós ? Para onde ir quando a nossa vida parece se congelar ? Existirá um lugar longe do grande mar congelado do qual Kafka nos falou onde podemos nos refugiar ?".
Caufield, visto de longe, é o heroi sem qualidades. Mas ele tem uma : é humano. Talvez a única qualidade que realmente interesse num homem. Mas esta é uma qualidade proscrita. É preciso coragem para pagar o preço que ela nos cobra quando resolvemos assumi-la. Por isso, tantos homens, mas tão poucos humanos. E Caufield parece querer pagar tal preço.
A Segunda sacada de Salinger: ele criou um título fantástico para sua obra. Um título genial para uma obra igualmente genial e que é explicada ao leitor numa conversa do protagonista com a sua irmãzinha Phoebe.
Aquele que tiver um mínimo de sensibilidade e ler este livro sempre se lembrará de Holden Caufield e do apanhador no campo de centeio.

Esse fragmento merece bis :

( ... )

- Você sabe o que eu quero ser quando crescer? - perguntei a ela. -Sabe o que eu queria ser? Se pudesse fazer a merda da escolha?
-O quê? Pára de dizer nome feio.
-Você conhece aquela cantiga: "Se alguém agarra alguém atravessando o campo de centeio"? Eu queria…
-A cantiga é "Se alguém encontra alguém atravessando o campo de centeio"! - ela disse. - É de um poema do Robert Burns.
-Eu sei que é de um poema do Robert Burns.
Mas ela tinha razão. É mesmo "Se alguém encontra alguém atravessando o campo de centeio". Mas eu não sabia direito.
-Pensei que era "Se alguém agarra alguém" - falei. - Seja lá como for, fico imaginando uma porção de garotinhos brincando de alguma coisa num baita campo de centeio e tudo. Milhares de garotinhos, e ninguém por perto - quer dizer, ninguém grande - a não ser eu. Eu fico na beirada de um precipício maluco. Sabe o que eu tenho de fazer? Tenho que agarrar todo mundo que vai cair no abismo. Quer dizer, se um deles começar a correr sem olhar onde está indo, eu tenho que aparecer de algum canto e agarrar o garoto. Só isso que eu ia fazer o dia todo. Ia ser só o apanhador no campo de centeio e tudo. Sei que é maluquice, mas é a única coisa que eu queria fazer. Sei que é maluquice.

( ... )

( eu por eu mesmo )

Nenhum comentário: