terça-feira, 29 de junho de 2010

A Influência das Ilusões nas Nossas Vidas

Traçar o papel das ilusões na gênese das opiniões e das crenças seria refazer a história da humanidade. Da infância à morte, a ilusão envolve-nos. Só vivemos por ela e só a ela desejamos. Ilusões do amor, do ódio, da ambição, da glória, todas essas várias formas de uma felicidade incessantemente esperada, mantêm a nossa atividade. Elas iludem-nos sobre os nossos sentimentos e sobre os sentimentos alheios, velando-nos a dureza do destino. As ilusões intelectuais são relativamente raras; as ilusões afetivas são quotidianas. Crescem sempre porque persistimos em querer interpretar racionalmente sentimentos muitas vezes ainda envoltos nas trevas do inconsciente. A ilusão afetiva persuade, por vezes, que entes e coisas nos aprazem, quando, na realidade, nos são indiferentes. Faz também acreditar na perpetuidade de sentimentos que a evolução da nossa personalidade condena a desaparecer com a maior brevidade.
Todas essas ilusões fazem viver e aformoseiam a estrada que nos conduz ao eterno e inevitável abismo. Não lamentemos que tão raramente sejam submetidas à análise da razão. A razão só consegue dissolvê-las paralisando, ao mesmo tempo, importantes móbeis de ação. Para agir, cumpre não saber demasiado. A vida é repleta de ilusões necessárias. Os motivos para não querer multiplicam-se com as discussões das coisas do querer. Flutua-se então na incoerência e na hesitação. «Tudo ver e tudo compreender», escrevia Madame de Stael, «é uma grande razão de incerteza». Uma inteligência que possuísse o poder atribuído aos deuses de abranger, num golpe de vista, o presente e o futuro, a nada mais se interessaria e os seus móbeis de ação ficariam paralisados para sempre. Assim considerada, a ilusão aparece como o verdadeiro sustentáculo da existência dos indivíduos e dos povos, o único com o qual se possa sempre contar. Os livros de filosofia esquecem-no por vezes.

(Gustave Le Bon, em 'As Opiniões e as Crenças' )

Nenhum comentário: